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25 de Abril de 2024

Degustador de cerveja que se tornou alcoólatra receberá R$ 50 mil por danos morais

Publicado por JurisWay
há 7 anos

Degustador de cerveja que se tornou alcolatra receber R 50 mil por danos morais

Desde 1967, o alcoolismo crônico, caracterizado pela dependência química do álcool, passou a ser classificado como doença pela Organização Mundial de Saúde - OMS. No Código Internacional de Doenças, o mal figura como Transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso de álcool - síndrome de dependência, ou seja, uma doença capaz de retirar a capacidade de compreensão e discernimento do indivíduo.

Como não poderia deixar de ser, em razão dos reflexos negativos do alcoolismo na vida profissional do indivíduo, a Justiça Trabalhista analisa inúmeros casos envolvendo empregados dispensados por justa causa devido ao uso do álcool. É que a embriaguez habitual ou em serviço está prevista no artigo 482 da CLT (alínea f) como justa causa para a rescisão do contrato de trabalho pelo empregador. Atualmente, discute-se no meio jurídico trabalhista se o alcoolismo pode continuar sendo aceito como motivo para a dispensa sem justa causa.

Mas, recentemente, o TRT mineiro analisou um caso diferente, em que o próprio trabalho do empregado numa famosa fábrica de bebidas contribuiu para que ele se tornasse alcoólatra! É que, entre as suas funções, estava também a de degustador de bebidas alcoólicas de forma voluntária durante a jornada. No processo, ficou demonstrado que a dependência de álcool surgiu depois que se tornou degustador. Com base em um conjunto de provas, a 5ª Turma confirmou a sentença que reconheceu a responsabilidade civil do empregador, apenas reduzindo o valor da indenização para R$50 mil. O voto foi proferido pelo juiz convocado Antônio Carlos Rodrigues Filho.

Em recurso, a empresa de bebidas esclareceu não existir a função de degustador na empresa, mas sim um banco de profissionais voluntários. Segundo destacou, os interessados se submetem a testes, exames e recebem curso específico de degustação. Os voluntários podem ou não participar das sessões, assim como são livres para deixar de compor o banco de degustadores a qualquer tempo. A tese defendida foi a de que a quantidade ingerida era pouca, não sendo nociva ao organismo. Por fim, a ré destacou não ser o reclamante usuário apenas de álcool.

Mas o relator não acatou os argumentos. Pelas provas, verificou que o reclamante trabalhava como operador e participou do quadro de provadores por dois anos. Mas ao longo de todo esse tempo, a ré comprovou a realização de exames médicos específicos apenas para ingresso na função. Para o julgador, ficou claro que a empresa não agiu com cautela e vigilância com a saúde do empregado inserido na atividade de degustação.

Ao analisar as provas, o magistrado também não se convenceu de que a quantidade de bebida alcoólica ingerida fosse ínfima e insuficiente para a afetar a saúde do trabalhador. Ele registrou que os controles de degustação juntados com a defesa, denominados avaliação sensorial, não continham as quantidade ingeridas e se referiam apenas ao ano de 2012. Ainda segundo o julgador, as testemunhas entraram em contradição no que se refere às quantidades ingeridas. Uma delas declarou que a degustação ocorre todos os dias.

A prova testemunhal esclareceu que eram oferecidos prêmios ao degustador, tais como caixa de cerveja, cooler, balde. Como ponderou o juiz convocado, até a premiação oferecida consistia em bebida alcoólica, além de acessórios que induzem ao consumo. Ele considerou espantosa a revelação de que reclamada convocava os trabalhadores em plena jornada de trabalho para experimentar bebidas alcoólicas e depois retornar à operação de máquinas. No caso do reclamante, as funções incluíam lidar com garrafas de vidro e cacos de vidro.

Ademais, testemunhas ouvidas confirmaram a aparência de embriaguez do operador no trabalho, com fala devagar e enrolada. Uma testemunha disse que sentiu diferença de comportamento dele antes e depois da degustação. Segundo relatou, antes era normal, depois passou a ficar recuado, nervoso, alterava a voz. O juiz não encontrou prova de que a fabricante de bebidas tivesse adotado medidas de prevenção do risco a que sujeitou o reclamante. Os treinamentos oferecidos eram apenas para garantir a qualidade do produto fabricado. Em depoimento, o preposto declarou que, se detectado algum caso de alcoolismo, a pessoa busca tratamento conforme as necessidades dela. Na visão do julgador, uma clara demonstração da negligência da ré.

Quanto ao uso de outras substâncias psicoativas pelo operador, entendeu o relator que não afasta da culpa da empresa de bebidas. Isto porque, conforme observou, a análise dos autos se limita ao consumo de álcool por ela oferecido. Para o magistrado, o fato inclusive agrava a situação da empresa, que deveria ter avaliado essa condição. A conclusão alcançada foi a de que não havia controle de saúde do trabalhador.

Por fim, foram consideradas irrelevantes as alegações de que não foram apontados outros empregados na mesma situação, bem como de inexistência de incapacidade para o trabalho. De igual modo, o fato de o reclamante estar longe do álcool atualmente. Na avaliação do juiz convocado, nada disso apaga a realidade configurada e nem o dano sofrido pelo trabalhador.

Mas o julgador considerou excessivo o valor de R$100 mil fixado em 1º Grau, já que a degustação de bebidas alcoólicas não foi a causa exclusiva do mal alegado pelo operador, atuando como concausa. Nesse contexto, acompanhando o relator, a Turma deu provimento parcial ao recurso para reduzir a indenização por danos morais para R$50 mil. Foi determinada a remessa de ofício ao Ministério Público Federal, comunicando a utilização dos empregados na degustação dos produtos da empresa de bebidas no curso da jornada normal de trabalho.

PJe: Processo nº 0011017-82.2015.5.03.0039 (RO). Acórdão em: 13/09/2016

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27 Comentários

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Muito oportuno e útil o artigo. Também o julgado. Pode parecer que é um caso isolado, porque foi objeto de ação judicial e a mídia divulgou, e, empobrecido como está o jornalismo, deixou de aproveitar o gancho para se aprofundar na matéria. É tão comum e até alarmante o índice de pessoas que exercem referida função e se tornam dependentes alcoólicos. Não há controle de saúde e sim, de qualidade do produto, por parte das empresas. A fiscalização, nem se menciona. O provador tem que ingerir bebida alcoólica, que ao contrario do que dizem, não é pouco, pois não existe degustação sem ingestão. Ele não prova só o sabor, mas também o teor alcoólico da bebida. É feito pela manhã e em jejum, principalmente quando o organismo está em estado de catabolismo. Dos provadores profissionais que conheci, alguns inclusive amigos, todos, sem exceção, eram alcoólicos. Ninguém trabalha na construção civil assumindo o risco de levar uma tijolada, bem como nenhuma faxineira de hospital trabalha esperando pela LER. É questão de saúde e segurança no trabalho. continuar lendo

Até que enfim um comentário arrazoado. continuar lendo

Grato, Emília. continuar lendo

Que palhaçada! É assim que a Justiça gasta nosso dinheiro?
Ser degustador de cerveja foi uma opção dele, mesmo sabendo que corria risco do alcoolismo. continuar lendo

Você tem muito o que aprender ainda, gurizinho. continuar lendo

Concordo com o "gurizinho". Não acho que a justiça exista para passar a mão na cabeça de pessoas sem noção da realidade. É o mesmo caso do café quente do McDonalds. Tem que ter um aviso de que está quente, não basta o colega ter pedido um CAFÉ e estar segurando a porcaria do copo QUENTE, tem que ter um neon piscando dizendo "CUIDADO, QUENTE" em letras garrafais, ou vai se queimar, dá um tempo! Ainda mais para justiça brasileira, que é um monstro lento. Seleção natural da espécie. Sem ela, estaríamos extintos. Se a degustação era VOLUNTÁRIA e ele é um indivíduo plenamente capaz, a culpa foi dele. Ponto final. continuar lendo

Certa está a empresa, que permitia funcionários operando máquinas depois de ingerir bebida alcoólica. Um acidente de trabalho - como de fato houve, pra quem não chegou a ler a sentença - seria, obviamente, culpa do voluntário. continuar lendo

Cinquenta mil???? Não paga sequer o tratamento para desintoxicação quiçá para os reflexos causados por esse vício maldito. continuar lendo

Isto é que é emprego! continuar lendo

Nesse país, o poste mija no cachorro. A criatura voluntariamente se candidata a provar bebidas alcoólicas, sendo usuário de psicotrópicos. Se vicia e a culpa é sempre do outro. Por isso seremos sempre terceirinho mundo, nunca sendo promovidos. Pq ser empresário com um povo e um judiciário desses, é coisa para heróis. E heróis são poucos. continuar lendo

Acontece que a empresa deve sempre zelar pelos seus colaboradores, empregando todos os mecanismos necessários à saúde e segurança no ambiente de trabalho, o que, no presente caso, não ocorreu. Poderia ter acontecido com você, com qualquer um de nós. continuar lendo